FGV fechou acordo de R$ 9 mi para encerrar investigações no Rio

A FGV (Fundação Getulio Vargas) assinou no ano passado um acordo com o Ministério Público do Rio de Janeiro que prevê o pagamento de R$ 9 milhões em troca do arquivamento de investigações sobre supostas fraudes envolvendo a instituição e seus dirigentes.
O TAC (Termo de Ajuste de Conduta) foi firmado em junho de 2021 e encerrou nove procedimentos investigatórios em curso, bem como uma ação civil pública que pedia a destituição da diretoria da fundação.
Parte das apurações envolvia suspeitas de contratos firmados com o governo estadual na gestão do ex-governador Sérgio Cabral, preso há seis anos e condenado por corrupção e outros crimes.
O acordo gerou polêmica dentro da Promotoria em razão do valor estabelecido frente ao dano aos cofres públicos estimado por técnicos do órgão. Também provocou queixas o fato de não ter sido prevista punição aos dirigentes que praticaram supostos atos ilegais.
Nesta quinta-feira (17), a FGV voltou a ser alvo de mandados de busca e apreensão na Operação Sofisma, conduzida pela Polícia Federal. De acordo com a apuração, a instituição de ensino foi usada para a fabricação de pareceres com o objetivo de mascarar o desvio de finalidade de contratos públicos.
A investigação está sob sigilo. A descrição dos fatos, porém, se assemelha à dinâmica descrita nos casos arquivados pela Promotoria após o TAC. Em nota, a FGV afirma se tratar dos mesmos temas incluídos no acordo.
“Causa estranheza e profunda indignação a reiteração, na esfera federal, de temas já sepultados perante a justiça estadual que, agora requentados, maculam gravemente a imagem de uma entidade que, há mais de 70 anos, tanto contribui para o desenvolvimento do Brasil”, diz a nota.
A FGV passou a ser alvo de uma devassa financeira após ser investigada nos desdobramentos da Operação Lava Jato no Rio de Janeiro. Ela chegou a ser alvo de busca e apreensão em 2018 no âmbito das investigações contra Cabral.
O ex-governador afirmou em depoimento ao juiz Marcelo Bretas que estudos da instituição eram usados para referendar tecnicamente obras que envolviam propina.
“Como a FGV é uma instituição, com muita justiça, de reputação, ela sempre foi usada como um biombo, de cobertura legal para efetivação de entendimentos prévios, digamos assim. Ela fugia da licitação e dava cobertura legal para estudos feitos por nós”, disse Cabral.
O TAC foi assinado após o Ministério Público oferecer uma ação civil pública na qual pedia a destituição da diretora da fundação por suposta fraude cometida em contrato com o governo fluminense envolvendo a preparação do edital de leilão das ações do antigo Berj (Banco do Estado do Rio de Janeiro).
A Promotoria também apontava desvio de finalidade da entidade, para obtenção de lucros indevidos por sua atividade, e distribuição ilegal de bônus a dirigentes por meio de contratos paralelos. Os ganhos seriam irregulares porque a FGV é uma instituição sem fins lucrativos, tendo benefícios por esse enquadramento.
A ação acabou rejeitada em primeira instância. Mesmo assim, a direção da FGV assinou o TAC com os promotores para arquivar o recurso interposto, bem como outras investigações em curso por práticas semelhantes.
Pelo acordo, a FGV é obrigada a pagar oito parcelas anuais de R$ 1,125 milhão para reparação dos danos causados. Dentro desse valor está incluído o oferecimento de vagas a servidores da Promotoria e bolsas a estudantes de escolas públicas em cursos da entidade, e entrega de laptops a órgãos do estado.

O Ministério Público, por sua vez, se comprometeu em arquivar as investigações ainda pendentes.

O fim das apurações provocou polêmica no Conselho Superior do MP-RJ, a quem cabe homologar os arquivamentos dos procedimentos propostos pelos promotores. A conselheira Flávia Ferrer destacou o fato de o valor total pago não se aproximar do dano ao erário estimado nem sequer no caso do Berj.
“O valor do dano ao erário apurado não está coberto pelo valor acordado com a FGV. O laudo do Gate [Grupo de Apoio Técnico] estima o dano em R$ 20,5 milhões”, afirmou a procuradora, em sessão no ano passado.
Ela também destacou o fato de nenhum dos dirigentes alvos da ação civil pública terem sido responsabilizados no acordo.
“Me incomoda a não responsabilização pessoal dos agentes que, em nome da FGV, teriam praticado atos de improbidade, lesando não apenas o erário, mas também o bom nome da fundação. A responsabilização pessoal das pessoas envolvidas nos contratos irregulares não se encontra prevista no contrato firmado”, disse ela.
Ao longo das sessões, os procuradores se queixaram do fato de o TAC ter sido homologado no Judiciário, no âmbito da ação civil pública, antes da ratificação dos arquivamentos pelo Conselho.
“O arquivamento de inquérito civil é ato complexo, que só se completa após homologação do Conselho Superior. A presença de decisão judicial homologatória anterior ao exame do arquivamento pelo Conselho Superior acaba engessando a atuação desse colegiado”, disse Ferrer.
Os procedimentos, contudo, acabaram sendo todos finalizados. Relator da homologação de um dos arquivamentos, o procurador Valberto Fernandes de Lima afirmou que contrariar o acordo já fechado na Justiça poderia manchar a reputação da Promotoria.
“É necessário dizer que a não homologação de arquivamento, ressalvado a hipótese de manifesta ilegalidade, importaria em o MPRJ descumprir o acordo que subscreveu, pondo em risco a segurança e a credibilidade de futuros TACs firmados pelo ‘parquet’ fluminense”, disse o procurador.
De acordo com a Promotoria, a fundação está em dia com os compromissos do TAC, tendo distribuído 150 laptops para diferentes órgãos públicos. Na última entrega dos equipamentos, ocorrida no mês passado ao Tribunal de Justiça, o promotor José Marinho Paulo Junior comemorou a celebração do acordo.
“O acordo não é uma derrota de nenhuma parte. É, como muito bem qualificado pelo presidente do TJ-RJ [Henrique Figueira], uma vitória de todos, perpassando os limites estreitos da briga judicial e trazendo frutos que todos hoje colhem”, afirmou o promotor de Justiça.
Em nota, a FGV afirmou que “o TAC foi assinado seguindo a máxima defendida pelo próprio MP, que prioriza a composição”.
“O TAC não só tem sido regiamente cumprido, como até de forma antecipada, como no caso das chuvas de Petrópolis no início do ano, oportunidade em que a FGV, atendendo a pedido do MPRJ, antecipou a entrega de laptops para substituir os equipamentos perdidos nas enchentes por órgãos de fiscalização locais.”
A instituição afirma ainda que “desde 2019 a FGV, assim como seus dirigentes, vêm sendo alvo de perseguição e vítimas de imputações quanto a supostos fatos de até 15 anos atrás”.
“A FGV reitera sua confiança nos poderes constituídos, em particular no Poder Judiciário brasileiro, e adotará todas as medidas cabíveis para defesa de sua história, que a tornou motivo de orgulho para o setor produtivo brasileiro, de sua imagem e da honradez com a qual, desde 1944, atua ao lado das principais instituições do país.”

Por Italo Nogueira/Folhapress
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