Juíza auxiliar do STF vítima de xenofobia denuncia acusado para empresa em que trabalha

Por Bahia Notícias

Foto: Reprodução / TRF-3

A defesa da juíza federal baiana Clara da Mota Santos Pimenta Alves, auxiliar de Edson Fachin no Supremo Tribunal Federal (STF), vítima de agressões verbais xenofóbicas, ingressou com uma denúncia junto à British Petroleum (BP) na segunda-feira (7), a fim de que a empresa aplique as medidas cabíveis com relação ao acusado de praticar os atos, que é membro do quadro de dirigentes da petrolífera no Brasil. Uma ação na esfera cível também deverá ser apresentada.
Segundo o pedido, a violência política aconteceu na última sexta-feira (4), quando estava em uma pizzaria na cidade de Cuiabá (MT) e um advogado, mencionado no documento como Rodolfo, se aproximou da mesa que estava com as filhas e proferiu afirmações, sem provas, que as eleições presidenciais deste ano foram fraudadas.
Em depoimento para a Polícia Federal, a vítima disse que durante a situação chegou a defender o sistema eleitoral e uma colega afirmou que ela exercia a função de juíza e atuava na Suprema Corte. Foi aí que o dirigente da BP, identificado na denúncia como Adriano Bastos, também se manifestou, agredindo Alves com palavras de cunho xenofóbico.
Conforme apontou o boletim de ocorrência, Bastos atribuiu a vitória do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT) à Bahia, estado que, nas palavras dele, "não produz nada" e "não possui PIB". Ele disparou outras ofensas com teor classista, afirmando que o eleitorado de Lula é formado por "assistidos", além de "funcionários públicos" que "não trabalham, não fazem nada".
A juíza alegou à PF que Bastos sabia que era baiana e sabia sua ocupação, já que as filhas dela e do dirigente convivem juntas há mais de dois anos. A denúncia formalizada pela defesa de Mota foi endereçada ao compliance da petrolífera.
A defesa expôs que a vítima voltou a reafirmar a lisura presente no processo eleitoral e, por conta das agressões verbais, temendo pela segurança das suas filhas, e sem poder se manifestar por conta do cargo que ocupa no Supremo, ela deixou o local se sentindo humilhada e constrangida.
O conteúdo da queixa endereçada à BP ressalta que Clara da Mota, assim como suas filhas, eram as únicas de origem baiana no restaurante. Ele sustenta que a situação envolvendo o executivo fere o Código de Conduta da organização, que diz respeitar a legislação e regulamentos do país em que ela está presente, assim como outros princípios éticos.
O texto também chama a atenção para o contexto político brasileiro, marcado pelo "ambiente de crise democrática em que setores da sociedade, notadamente ligados à extrema direta, questionam o resultado das eleições". Os insatisfeitos deslegitimam a vitória do candidato à Presidência eleito, bem votado por grupos minotirários, e a derrota do atual presidente Jair Bolsonaro (PL), que teve uma pior performance eleitoral no eleitorado nordestino, entre as mulheres, negros e povos indígenas.
Ao Bahia Notícias, por telefone, a juíza auxíliar se absteve a destacar que o episódio que aconteceu com ela "é um caso entre centenas e milhares, de uma forma de violência política que está epidêmica em nosso no nosso país, contra essa população que vive no Nordeste, com componentes de classismo".
Ela disse que tornar o caso público se dá "no sentido de mostrar que essa é uma obrigação [a de combater tal forma de preconceito] não só do Judiciário, mas das empresas que têm responsavilidade social e de tosos os cidadãos e cidadãs que têm que respeitar as leis do país".
A situação, esclareceu Mota, já foi comunicada para as autoridades responsáveis. A reportagem do BN procurou a empresa British Petroleum, mas não obteve nenhuma devolutiva até a publicação desta matéria.
Em repúdio ao ocorrido, a Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe) emitiu uma nota em que rechaça os ataques contra a denunciante e suas filhas. "A liberdade de expressão não deve jamais ser confundida com liberdade de agressão ou de se manifestar com intolerância ou de forma discriminatória, por simples discordância de pensamento. Ataques dessa natureza a magistrados e magistradas federais não serão admitidos", pontuou a entidade no comunicado, que também indica o ingresso de uma ação de danos morais contra o homem que proferiu os insultos.
"Para a Ajufe é violência política manifestada por meio de inaceitáveis atitudes preconceituosas, autoritárias, antidemocráticas e que propaguem o ódio e a intolerância. Agressões misóginas e xenófobas contra qualquer cidadão, como a que foi sofrida pela magistrada federal, revelam completa falta de humanidade, respeito, empatia e civilidade por parte dos agressores e constituem crime que deve ser punido com todo o rigor da lei", enfatizou outro trecho da nota.
Defendendo a legitimidade das urnas eletrônicas, a condução do pleito, bem como o Estado Democrático de Direito, a associação afirmou ainda que vai acompanhar os desdobramentos da apuração do episódio, esperando a responsabilização do acusado, inclusive na esfera criminal. A Ajufe lamentou que não exista o que chamou de "mecanismos efetivos para coibir a violência política contra juízes e juízas federais".
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